Leituras de 1900
Longe vão os tempos em que Rio Maior não tinha uma Biblioteca. Não se estranhe, de resto, que em 1900 ela não se fizesse sentir uma vez que o analfabetismo no concelho rondava os 80 % e a generalidade dos riomaiorenses lutava, diariamente, pelo sustento familiar em cujas dificuldades mergulhavam as crianças e os jovens feitos adultos à pressa e obrigados, pelas condições, ao trabalho nos campos e nas oficinas.
Em 1911 o Ministério do Interior, que então tutelava a educação, perguntava à Câmara Municipal, em ofício de Março, se o concelho dispunha de alguma Biblioteca. A pergunta deixava no ar a impressão de alguma coisa ir acontecer, de algum interesse finalmente se manifestar e levar à prática um desejo que só os esclarecidos, cultos ou escolarizados, sabiam ser necessário e imprescindível. Mas dois anos depois ainda a Câmara se lamentava junto do Governo Civil porque «as finanças do município não permitiam proceder à instalação de tão útil melhoramento»[1].
Antiga bibliotecaDe facto, já nessa época era notório o atraso e, à medida que o século avançou, mais distante fomos ficando porque a boa vontade e as esperanças dos republicanos não se concretizaram. As vilas e aldeias do Portugal rural, marcadas profundamente pela inércia dos governantes e por uma certa resistência passiva das famílias fizeram com que a educação, a instrução e a cultura, marcassem passo. Trágicos anos esses que excluíram gerações sucessivas de portugueses.
Em Rio Maior, porém, nem tudo foi mau muito por culpa de um punhado de homens e mulheres que - contra ventos e marés - lutaram incessantemente por dar aos outros um pouco do seu saber, abrindo-lhes as portas de um mundo novo e de novas oportunidades que cada um foi capaz de realizar. O jornalismo riomaiorense é bem o exemplo dessa entrega e, porventura, da iniciação de muitos na arte da leitura, o mesmo é dizer do prazer da descoberta.
No meio século que separa a primeira edição de ‘O Riomaiorense’ até à institucionalização da primeira biblioteca, a leitura e a escrita estendem-se, pouco a pouco, a novos grupos sociais que a exercitam por obrigação profissional mas também por consciência social e política.
Leituras Novas em 1950
No pós-guerra o país ensaia novos caminhos e em Rio Maior, pela mão sábia e empreendedora do Doutor Alexandre Laureano Santos vai, finalmente, construir-se a primeira biblioteca no concelho. Segue, aliás, anteriores exemplos de generosidade e entrega à causa da instrução e da cultura: o Professor Manuel José Ferreira que funda, em 1893, o primeiro jornal em Rio Maior; e o Doutor Augusto César da Silva Ferreira que funda, em 1924, a Escola Comercial Municipal.
Laureano Santos, advogado e professor na Escola Comercial, consegue reunir as verbas necessárias e realizar obras de adaptação no próprio edifício da escola. Recolhe livros e revistas que junta aos vários milhares seus que doa à biblioteca; estabelece um horário independente da escola e dinamiza como ninguém um espaço que, desde a sua inauguração, em 1950, vai conhecendo um acréscimo e uma implantação significativas na comunidade riomaiorense.
Em 1956[2] tem cerca de 800 leitores e todo o acervo bibliográfico catalogado em ficheiros manuais, por temas, autores e títulos. Até 1965 crescerá ainda o número de leitores para os 1084 e o número de volumes rondará os 2100. Depois, a biblioteca entra em declínio coincidindo, aliás, com a saída do Doutor Laureano Santos que transfere a sua residência para Lisboa onde exerce a advocacia e acompanha de perto os seus filhos que estudam na faculdade.
Em 1970 a Escola Comercial Municipal dá lugar à Escola Secundária, então ainda um pólo da Escola Comercial e Industrial Rafael Bordalo Pinheiro, das Caldas da Rainha. O edifício é então desocupado, a biblioteca encerrada e todo o acervo encaixotado e reunido nas instalações do Grémio do comércio onde permanecerá, durante toda a década, sem qualquer tratamento nem possibilidade de consulta.
Interior da antiga biblioteca«Com grande sentido de oportunidade, a 14 de Março de 1980 é constituída a Associação Cultural do Concelho de Rio Maior, cuja principal preocupação era a Biblioteca Pública. Os primeiros meses foram dedicados à organização do espólio da antiga Biblioteca, 2568 volumes divididos em 13 caixotes e cujos temas estavam pouco actuais».[3] Terminadas a inventariação e classificação, a biblioteca é (re)inaugurada a 13 de Julho de 1981, já com a designação de Biblioteca Municipal Dr. Alexandre Laureano Santos, ocupando agora todo o espaço do antigo edifício da Escola Comercial.
Virada, prioritariamente, para a juventude a Biblioteca ganha de novo um renovado fôlego. Dispondo de 44 lugares de leitura, são os alunos do ensino primário e secundário os grandes utilizadores manuseando um acervo que não pára de crescer[4]: 7.224 livros, 11.204 jornais entre os vários títulos regionais que o concelho conheceu. A breve prazo, o espaço torna-se pequeno e as condições técnicas começam a não corresponder aos novos tempos e, sobretudo, às novas tecnologias.
Leituras renovadas em 2000
Sala de Audio-VídeoCom o novo século inicia-se o processo de transferência para o novo edifício, construído de raiz e especificamente para a função a que se destina: a de Biblioteca Pública. Desenvolvendo-se apenas num só piso, dispõe de múltiplas valências: sala de leitura de adultos, sala de leitura infantil, sala de audio/vídeo, sala polivalente para debates, conferências, colóquios e outros eventos culturais, bem como oito ligações de livre acesso à Internet.
Inaugurada em 6 de Novembro de 2001, esta nova infra-estrutura presta ainda homenagem a um dos grandes homens de letras do país com a sala Poeta Ruy Belo, amante que foi da história e cultura riomaiorense. Também Armando de Castro, insigne historiador da área económica, riomaiorense de nascimento, teve já justa homenagem neste nobre espaço. São filhos ilustres de quem a terra se orgulha e não esquece.
Augusto M. Tomaz Lopes
Licº em História
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[1] Cf. Livro de Actas da Câmara nº 24, Sessão de 23/04/1911, fl. 55 v.
[2] Cf. VICENTE, Ana Cristina, Breve historial da Biblioteca Municipal em Rio Maior, Gab. Turismo da Câmara Municipal, Nov. 2000, pp. 3.
[3] Cf. Idem, Ibidem.
[4] Cf. Idem, Ibidem.